Porque eu amo o Implante Coclear
Escrito por Lak Lobato em 26/05/2013
Lamento imensamente que haja pessoas capazes
de falar mal do implante coclear…
Eu passei 23 anos de minha vida em silêncio. Silêncio este que não escolhi. Ele
veio numa noite quando faltava poucas semanas para completar 10 anos e levou
embora a capacidade sensorial que nos conecta com o mundo ao nosso redor.
Seria mentira se eu dissesse que fui infeliz nesses 23 anos. Quem me conheceu
durante esse período sabe que sempre fui uma pessoa alegre, que tirava de letra
todas as mazelas do dia a dia. Eu sempre estudei. Namorei muito. Fiz todos os
cursos e viagens que o meu bolso (e da minha mãe) me permitiu. Minha vida nunca
foi menor ou incompleta só porque eu tinha deficiência auditiva…
Mas, confesso que sempre senti falta de ouvir. Somos seres sensoriais. Gostamos
do toque firme de um abraço. Do cheirinho de pão quente e café recém passado de
manhã. Fazemos poesia para a beleza do pôr-do-sol. Adoramos o sabor das frutas
frescas colhidas direto do pé. Por que ouvir seria diferente? Nosso entusiasmo
depende muito do que sentimos, do estímulo desses sentidos que nos definem como
seres humanos.
E, como meu sentido auditivo me foi negado pela biologia, coube buscar recursos
tecnológicos para poder alcança-lo novamente.
O implante coclear não é barato, concordo. Há pessoas que ganham dinheiro com
ele, também concordo. Mas são essas mesmas pessoas que tornam essa realidade
possível.
E quem pode mensurar o valor monetário do pôr-do-sol ou o preço de um abraço
apertado dado pelo ente amado num dia frio? Quanto você estaria disposto a pagar
por aquilo que torna a vida melhor, mais intensa e verdadeira?
Depois de 23 anos de silêncio, foi graças ao implante coclear que pude ouvir o
som da chuva. O barulho do mar. Descobrir que o miado dos gatos é um som e que
não tem nada a ver com a palavra “miau” que usam para se referir a isso. Pude
gargalhar com o som da pipoca estourando no meio de uma tarde chuvosa. Pude me
surpreender com o som da minha própria respiração…
Três anos depois, um novo milagre: o segundo IC me deu acesso outra vez à voz
humana. E pude descobrir o valor imensurável de cada palavra que, lentamente,
era capaz de decifrar. Frases que tomaram conta do meu cotidiano. Descobri que
as pessoas falam enquanto abraçam. Que o sotaque dos cariocas é delicioso de
ouvir. Descobri que as palavras cantadas ficam diferentes das faladas. Descobri
o que é uma jura de amor dita ao pé do ouvido. Que facilidade é pegar o telefone
e trazer pro fundo da alma a voz de un amigo querido a 450km de distância.
Tudo isso e mais um número infinito de sons que sou incapaz de listar, são o
valor que define o implante coclear.
Quando país de crianças nascidas surdas escolhem o IC para seus filhos, não é
porque querem que seus filhos sejam perfeitos, ou porque querem esconder uma
deficiência. Eles querem que os filhos tenham acesso a todas as experiências
riquíssimas que só são possíveis através do sentido auditivo. E privar crianças
dessa experiência só porque tem gente preocupada em manter uma cultura deveria
ser considerado crime. A cultura deveria servir seres humanos e não humanos
serem escravos dela!
O IC não impede ninguém de aprender qualquer idioma que seja. Tampouco proíbe
que a LIBRAS seja o primeiro idioma de alguém.
Mas negar o IC, criar teorias conspiratórias, propagar lendas falaciosas,
ameaçar exclusão do grupo aos que optam por tentar ouvir, isso tudo impede o
real direito inalienável de escolha.
Quando optei por divulgar o IC, em momento algum tive pretensão de me tornar
porta-voz dessa tecnologia. Eu apenas amei poder voltar a escutar. Mesmo ciente
que não estava curada. Apenas tenho acesso ao som através de um recurso
tecnológico. Mas, a revelia das minhas pretensões, se é de mim que esperam uma
resposta, aí está: que o medo não nos torne reféns!
O implante coclear é uma das maiores invenções da medicina. Que todos aqueles
que tenham indicação para usá-lo, tenham também oportunidade. Ele vale a pena!
Torna a vida mais rica, mais intensa, mais completa.
Falo isso pelas minhas experiências diárias, relatadas com paixão, com
sinceridade, com humildade. Apenas tudo o que desejo para qualquer outro ser
humano. Sem querer nada em troca!
Beijinhos sonoros,
Lak
FONTE: http://desculpenaoouvi.laklobato.com
QUEM É LAK LOBATO:
http://desculpenaoouvi.laklobato.com/index.php/sobre/
Vídeo com uma entrevista com Lak Lobato,
falando sobre sua experiência como surda e como implantada:
http://www.youtube.com/watch?v=_ILjV_9x680
ou
http://vimeo.com/27595997